Voyager I: updates à distância e detecção à deriva
- João Álvaro e Guilherme Armond MT
- 1 de out.
- 4 min de leitura
Como o corrigir e manter em funcionamento uma sonda à 25 bilhões de quilômetros da Terra

Voyager 1 é uma sonda espacial lançada pela NASA em 5 de setembro de 1977, com o objetivo principal de sobrevoar Júpiter e Saturno, capturando imagens e coletando dados científicos sobre esses planetas. Após concluir com êxito sua missão principal no sistema solar em 1980, a Voyager 1 não cessou suas operações e continuou sua trajetória em direção ao espaço interestelar. Atualmente, encontra-se a aproximadamente 24 bilhões de quilômetros da Terra, sendo o primeiro objeto humano a cruzar a heliopausa, que marca o limite do nosso sistema.
A comunicação com a sonda é mantida através da Deep Space Network (DSN) da NASA, uma rede global de antenas que permite o envio de comandos e o recebimento de dados, e, hoje em dia, ainda carrega diversos instrumentos, como câmeras, espectrômetros, magnetômetros, detectores de partículas carregadas e sensores de plasma. Estes são comandados pelos seus três sistemas operacionais: o Sistema de Comando por Computador (CCS), o Sistema de Controle de Atitude e Articulação (AACS) e o Subsistema de Dados de Voo (FDS), com os três juntos tendo uma memória máxima de 69 Kb, mostrando a inovação e o avanço que foi o desenvolvimento da sonda durante os anos 70.

Imagem da Terra (ponto branco na listra central) tirada pela Voyager)
O ERRO
Em 14 de novembro de 2023, a Voyager 1 começou a enviar dados incompreensíveis, consistindo de sequências aparentemente aleatórias de zeros e uns. Os comandos eram recebidos e executados, mas a transmissão de retorno era composta apenas pelas sequências binárias, que cortavam as informações de seus instrumentos e de seu funcionamento. Em dezembro do mesmo ano, a NASA descobriu que o Subsistema de Dados de Voo não conseguia usar sua unidade de modulação de telemetria, a qual deixava possível a transformação da data pura nas ondas de rádio que eram transmitidas e, após uma análise posterior, confirmou que aproximadamente 3% da memória do FDS estava corrompida.
Era provável que o único chip presente na sonda apresentasse falhas, pois era o responsável por armazenar porção da memória afetada. No início da jornada ocorreram problemas no segundo chip, que serviria como sistema de "redundância", e acreditava-se que, pela degradação causada por 46 anos em operação, o componente teria começado a falhar e corromper os dados transmitidos, não tendo a peça de substituição e sendo responsável pelas falhas no envio dos dados captados pela sonda.
Em março de 2024, os engenheiros decidiram fazer um "poke", expressão da computação que descreve a alteração manual de dados do programa, cuja aplicação fez o FDS transmitir uma nova sequência de informações. Esta foi descoberta como um despejo de memória completo, como se fosse uma “foto” dos dados da própria Voyager. O despejo permitiu que os cientistas fizessem uma comparação entre o código atual da Voyager e o código original, não degradado, assim revelando a localização exata do segmento corrompido e apontando a seção do código afetada.

(Foto de Saturno tirada pela sonda em novembro de 1980)
SOLUCIONANDO AS FALHAS
Era necessário impedir que o segmento corrompido fosse utilizado quando o programa normal fosse rodado. Todavia, era extremamente difícil escrever um novo código para a Voyager 1, uma vez que seu sistema era muito antigo e não existia compatibilidade entre ele e muitos softwares recentes. Por isso, foram utilizados códigos documentados em anotações manuscritas e diagramas de décadas atrás. Nestas anotações, foi encontrado um comando chamado "minimal command routine", que era enviado ao FDS e fazia a Voyager 1 enviar dados simples de volta (como um "Hello World!"). Após 2 dias de compilação manual dos comandos na Voyager 1, a NASA conseguiu transmitir o código para a sonda e aguardou sua captação. Após muito tempo, a NASA recebeu de volta dados legíveis, provenientes das modificações feitas ao código da sonda, demonstrando que era possível modificar, da Terra, o computador do satélite.
A partir disso, para retomar a função, era necessário que todo o código estivesse fora da parte corrompida. No entanto, não existia armazenamento suficiente para o translado, devido aos 69 Kb que já estavam sendo utilizados no chip de armazenamento. Foi necessário, assim, que fosse deletada grande parte do código original, que já não tinha mais uso ou capacidade de aplicação. Este era o caso de programas como o código para câmeras que não funcionavam mais, dentre outros. Com isso, o código afetado foi quebrado em seções menores e distribuído em partes não corrompidas do FDS. Em 18 de abril de 2024, foi feito o upload do código modificado e, em 13 de junho de 2024, a transmissão completa de dados científicos foi restabelecida.
CONCLUSÃO
A recuperação da Voyager 1 em 2024 demonstra a engenhosidade humana ao manter funcionando uma tecnologia dos anos 70. A sonda, que carrega o Disco de Ouro como mensagem para possíveis civilizações extraterrestres, continuará explorando o espaço interestelar.
Entretanto, seu tempo é limitado já que, até 2030, seus geradores não terão energia suficiente para manter os instrumentos ativos, e a comunicação será perdida gradualmente. Mesmo em silêncio, a sonda seguirá sua jornada pelo cosmos como embaixadora da humanidade, carregando consigo o testemunho de uma civilização que ousou sonhar e alcançar o infinito.

(Animação representante da trajetória da sonda Voyager I)
FONTES
[1]. Voyager 1. Em: Wikipédia, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2025. Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Voyager_1#Communication_issues>. Acesso em: 27 set. 2025.
[2]. MANLEY, Scott Park. The First Interstellar Software Update - The Insane Hack That Saved Voyager 1. Youtube, 2025. Disponível em: <https://youtu.be/p0K7u3B_8rY>. Acesso em: 28 set. 2025.
[3]. BARNETT, Amanda. Voyager 1: The most distant human-made object. NASA, 2025. Disponível em: <https://science.nasa.gov/mission/voyager/voyager-1/>. Acesso em: 29 set. 2025.
FONTES - IMAGENS
[1]. Disponível no link: https://www.nationalgeographicbrasil.com/espaco/2017/09/voyager-aos-40-anos-para-onde-vao-as-espaconaves-da-nasa-agora. Acesso em 30 set. 2025.
[2] Disponível no link: https://science.nasa.gov/mission/voyager/images-voyager-took/. Acesso em 30 set. 2025.
[3]. Disponível no link: https://science.nasa.gov/mission/voyager/images-voyager-took/. Acesso em 30 set. 2025.
[4]. Disponível no link: https://en.wikipedia.org/wiki/Voyager_1#/media/File:Animation_of_Voyager_1_trajectory.gif. Acesso em 30 set. 2025.





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