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Resenha “Um defeito de cor”

  • Clara Lopes e Laura Silva - MC
  • 8 de out.
  • 2 min de leitura

O livro de Ana Maria Gonçalves é um perfeito exemplo de que quando uma história é bem escrita, mesmo que seja fictícia, o leitor se sente inserido de tal forma que crê que a narrativa é real e que está lendo uma coletânea de todos os

documentos deixados. Felizmente, com “Um defeito de cor” pude experienciar essa

exata sensação que nenhum outro livro tinha me causado.

Com um enredo único em narração de primeira pessoa, Luísa, ou melhor, Kehinde, conta toda sua vida desde a sua infância em Suvalu e sua fuga para a cidade litorânea de Ouidá com sua avó e sua irmã gêmea, Taiwo, após a morte de

sua mãe e seu irmão mais velho. Assim, a narrativa segue com sua captura e a

tortuosa viajem transatlântica no navio “tumbeiro” com diversas mortes significativas. Chegando a Salvador, Kehinde é comprada e levada como escrava para uma grande fazenda a fim de trabalhar servindo aos seus senhores, variando entre períodos no serviço da casa grande e do campo. Ali vive os horrores da

escravidão, incluindo castigos e trabalhos desgastantes, até que é vítima de estupro

pelo seu senhor aos 12 anos de idade. A partir desse ponto sua vida tem uma virada com a mudança para a capital da Bahia, Salvador, e o começo de seu trabalho como escrava de ganho. Agora, focada em comprar sua liberdade, a trama desemboca em uma etapa marcada pela pressão de sucessivos eventos e pela ansiedade constante por decisões a serem tomadas que podem mudar o rumo da

vida de Kehinde.

Depois de várias idas e vindas, separações, mortes, desaparecimentos e muita,

mas muita luta, acompanhamos a nossa personagem em sua tentativa de construir

seu espaço em uma sociedade que insiste em apagá-la e negá-la, e percebemos que mesmo depois de tudo pelo que ela passou, ela era considerada inferior e pior que os demais devido ao seu “defeito de cor”. Essa narrativa forte desenvolve uma triste realidade que nem 1% dos escravizados reais tiveram, uma vez que em certos momentos Kehinde teve sorte, possibilitando que fosse liberta e ascendesse

economicamente. As 950 páginas nos fazem pensar sobre esse período obscuro daconstrução do Brasil, que ainda apresenta resquícios de uma sociedade escravocrata desde suas raízes, coisa impregnada e estrutural.

Em resumo, essa foi a melhor obra que já li, simplesmente completa do início ao

fim, que, além de ser um ótimo repertório sociocultural para os vestibulandos, é uma

reflexão profunda sobre a escravidão que te faz evoluir como ser humano. Quando se termina essa leitura densa e rica em todos os melhores sentidos, sentimos como se chegássemos ao fim de uma longa jornada, nos sentimos como a idosa Kehinde escrevendo a luta de uma vida inteira. Ainda hoje, sinto que daria muita coisa para ler esse livro como se fosse a primeira vez.

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