Princípios Físicos da Terapia por Captura de Nêutrons pelo Boro
- Júlia Leal David MT
- 8 de ago.
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Atualizado: 10 de ago.
O mecanismo nuclear e os fundamentos físicos que sustentam a BNCT

A Terapia de Captura de Nêutrons de Boro (BNCT) é uma técnica que visa tratar seletivamente células tumorais, preservando as células normais, por meio do uso de um composto de boro. Gordon Locher foi o primeiro a propor o princípio da BNCT em 1936 e levantou a hipótese de que, se o boro pudesse ser seletivamente concentrado em uma massa tumoral e o volume então exposto a nêutrons térmicos, uma dose de radiação maior seria produzida no tumor em relação ao tecido normal adjacente.

A BNCT designa um procedimento para o tratamento do câncer, baseando-se numa técnica onde os dois componentes utilizados podem ser controlados separadamente. O primeiro componente corresponde a um composto intravenoso de 10B. Este composto, por sua vez, possui maior propensão a se acumular em células cancerígenas. Após a ingestão do composto pelo paciente, este é submetido à irradiação por um feixe de nêutrons. Ao ser irradiado por nêutrons, átomo de boro captura um nêutron e sofre uma reação nuclear que produz duas partículas altamente ionizantes, uma carregada e com maior poder de ionização e outra neutra, mas com energia cinética de recuo suficiente para ionizar as moléculas, as quais possuem um alcance de aproximadamente o diâmetro de uma célula, com energia suficiente para causar danos letais às células tumorais através da ionização das moléculas.
Como as células normais possuem uma pequena ou nenhuma quantidade desse composto, e como o alcance das partículas produzidas pela interação é curto, as células sadias não são destruídas.

A escolha do 10B deve-se ao fato de podermos formar compostos não radioativos e quimicamente inofensivos ao organismo. O 10B possui uma alta seção de choque para absorção de nêutrons lentos, e em relação aos elementos que compõem o tecido corporal, hidrogênio 1H, carbono 12C e oxigênio 16O, o Boro tem uma seção de choque cerca de mil vezes maior. Este composto é preparado em um laboratório farmacêutico seguindo os procedimentos já padronizados pela indústria farmacêutica.

Depois que o paciente recebe o medicamento com 10B, ele é exposto a um feixe de nêutrons de baixa energia, vindo de uma fonte preparada para direcionar e filtrar o feixe corretamente. Para que o tratamento funcione bem, é importante que haja muito mais boro nas células do tumor do que nas células saudáveis. Assim, apenas as células doentes serão destruídas. Isso pode acontecer de duas formas: ou as células cancerígenas absorvem mais boro que as normais, ou todas absorvem a mesma quantidade, mas as células saudáveis eliminam o boro mais rápido. Com o tempo, isso faz com que a quantidade de boro nas células doentes fique maior do que nas saudáveis.
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA BNCT
A primeira tentativa de BNCT foi realizada em um paciente diagnosticado com glioma maligno em 1951, usando o reator de pesquisa nuclear atualmente disponível no Brookhaven Graphite Research Reactor. Seguido por 3 séries de processo de tratamento usando BNCT foi realizado em 40 pacientes usando compostos de boro simples, mas eles foram relatados com efeitos colaterais graves.
Em 1963 dos reatores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts trataram 18 pacientes usando decahidrodecarborato dissódico, que foi considerado menos tóxico, mas era capaz de entregar mais compostos de boro para a célula. Tendo em mente o potencial efeito colateral e toxicidade causados pela BNCT e o dano potencial do uso de reatores nucleares, os EUA interromperam o progresso da BNCT em 1961.
De forma lenta e gradual, a BNCT voltou a ganhar espaço, mas foi predominantemente limitada a países com instalações de reatores de pesquisa capazes de fornecer feixe de nêutrons epitérmicos, que tinham melhor penetração no tecido.
CONCLUSÃO
A BNCT é uma abordagem inovadora e promissora no tratamento de cânceres. Embora seu conceito tenha evoluído em 1936, houve um aprimoramento constante no conhecimento e na compreensão da ciência por trás dele, no desenvolvimento de ensaios clínicos e na sua aplicação clínica. Ainda que a técnica não tenha alcançado sua popularidade, certamente em breve ela será um marco no campo da radioterapia para o tratamento de câncer.
REFERÊNCIAS
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IMAGENS
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