Potencial de possível vida microscópica em rocha de Marte
- Júlia Leal David MT
- 3 de out.
- 4 min de leitura
Análise de amostras do Rover Perseverance na Cratera Jezer

Em setembro de 2025, a NASA divulgou a análise de uma amostra de rocha coletada em julho de 2024 pelo rover Perseverance na Cratera Jezero, em Marte. A amostra, denominada "Sapphire Canyon", extraída da formação geológica Bright Angel, revelou padrões incomuns de minerais e vestígios de moléculas orgânicas. Tais características, incluindo texturas microscópicas apelidadas de "sementes de papoula" e "manchas de leopardo", indicam processos geoquímicos que, na Terra, estão frequentemente associados à atividade microbiana antiga. A presença dos minerais vivianita e greigita em associação com carbono orgânico sugere a ocorrência de reações químicas impulsionadas por processos redox, um mecanismo que pode sustentar a vida. Embora os cientistas enfatizem a necessidade de análises laboratoriais aprofundadas na Terra para confirmar a origem biológica, este achado representa o indício mais forte de vida microbiana passada detectado pelo Perseverance até o momento, reforçando a habitabilidade potencial de Marte há bilhões de anos.
INTRODUÇÃO
A missão Mars 2020 da NASA, com o rover Perseverance, tem como principal objetivo a astrobiologia: buscar sinais de vida microbiana antiga em Marte, caracterizar a geologia e o clima passado do planeta e coletar amostras de rochas e regolito para um futuro retorno à Terra. A Cratera Jezero, local de pouso do rover em fevereiro de 2021, foi selecionada devido à sua história geológica, que inclui um antigo delta fluvial e um lago, ambientes considerados propícios para o desenvolvimento e preservação de bioassinaturas.
Em setembro de 2025, a comunidade científica foi alertada para uma nova e significativa descoberta relacionada à análise de uma amostra coletada na formação rochosa sedimentar denominada Bright Angel, localizada na borda de Neretva Vallis, um antigo vale fluvial que deságua na cratera.
COLETA E ANÁLISE DE AMOSTRAS
A amostra, batizada de "Sapphire Canyon", foi coletada em julho de 2024 de uma rocha (apelidada de "Cheyava Falls") pertencente à formação Bright Angel. A rocha é uma lodolita, um tipo de rocha sedimentar formada a partir de lama e silte depositados em água, indicando a existência de um ambiente aquoso pretérito.
A análise inicial foi realizada utilizando os instrumentos científicos do Perseverance, notadamente o PIXL (Planetary Instrument for X-ray Lithochemistry) e o SHERLOC (Scanning Habitable Environments with Raman & Luminescence for Organics & Chemicals). O PIXL fornece a composição elementar e mineralógica em escala fina, enquanto o SHERLOC detecta compostos orgânicos e minerais.
DESCOBERTAS DE BIOASSINATURAS POTENCIAIS

Os dados revelaram uma complexa associação química e mineral na amostra, caracterizada por texturas singulares:
"Manchas de Leopardo" e "Sementes de Papoula": Estas são estruturas em escala submilimétrica e milimétrica, respectivamente, que foram identificadas como nódulos enriquecidos em minerais de ferro.
Minerais Chave: A análise identificou a presença de vivianita (fosfato de ferro ferroso) e greigita (sulfeto de ferro).
Associação com Carbono Orgânico: O instrumento SHERLOC detectou a presença de carbono orgânico em estreita associação espacial e química com os nódulos ricos em ferro e os minerais vivianita e greigita.
Na Terra, a formação de vivianita e greigita, especialmente em ambientes sedimentares de baixo oxigênio, está frequentemente ligada à atividade metabólica de microrganismos que utilizam processos redox, como a redução microbiana de sulfato e ferro. Além disso, a presença de moléculas orgânicas neste contexto geoquímico reforça a hipótese de um sistema biológico.
DISCUSSÃO
As descobertas na formação Bright Angel sugerem fortemente que a Cratera Jezero foi um ambiente com condições favoráveis à vida no passado. A presença de água, lodolitos (excelentes preservadores de fósseis) e a identificação de minerais redox-ativos em conjunto com o carbono orgânico, colocam a amostra "Sapphire Canyon" como o candidato mais promissor a bioassinatura encontrado até o momento pela missão Perseverance.
Contudo, é crucial manter a cautela científica. A formação desses minerais e a preservação de moléculas orgânicas também podem ocorrer através de processos geoquímicos puramente abióticos (sem a participação de organismos vivos), como reações hidrotérmicas ou metamorfismo de baixo grau. A distinção inequívoca entre bioassinaturas e processos químicos naturais, especialmente em um ambiente extraterrestre, é um desafio complexo.

O passo definitivo para confirmar ou refutar a origem biológica destas assinaturas depende da Missão de Retorno de Amostras de Marte (MSR), um esforço conjunto da NASA e da Agência Espacial Europeia (ESA) programado para a próxima década. As análises em laboratórios terrestres, com instrumentação muito mais sofisticada do que a disponível no rover, permitirão o exame detalhado das texturas, composições isotópicas e enantioméricas das moléculas orgânicas, fornecendo a validação científica necessária.
CONCLUSÃO
As descobertas do rover Perseverance em setembro de 2025, envolvendo a amostra "Sapphire Canyon", representam um marco na astrobiologia. A complexa associação de vivianita, greigita e carbono orgânico em estruturas texturais únicas na Cratera Jezero constitui um poderoso indício de que Marte pode ter sido habitado por vida microbiana há bilhões de anos. Este achado valida a escolha da Cratera Jezero como alvo de exploração e aumenta a urgência e a expectativa da Missão de Retorno de Amostras de Marte, que promete reescrever a história da vida no Sistema Solar.
IMAGENS
[1] Rover Perseverance faz selfie em Marte em setembro de 2021, 198º dia da missão. — Foto: NASA/JPL-Caltech
[2] Manchas escuras em rocha de Marte, registradas pelo robô Perseverance em julho de 2024, podem indicar reações químicas ligadas à presença de vida microscópica no passado. — Foto: NASA/JPL-Caltech/MSSS
[3] Representação artística mostra a técnica do "guindaste voador" baixando o rover Curiosity da Nasa em Marte. A agência espacial cogita usar essa mesma técnica para trazer rochas marcianas à Terra. — Foto: Nasa/JPL-Caltech
FONTES
AGÊNCIA BRASIL/REUTERS. NASA encontra possíveis sinais de vida antiga em rochas de Marte. Agência Brasil, 10 set. 2025. Acesso em: 02 out. 2025.
FOX, Nicky. (2025). Declaração à Imprensa. In: NASA to Share Details of New Perseverance Mars Rover Finding. NASA News Release, 10 set. 2025. Acesso em: 02 out. 2025.
NASA. Mars 2020 Perseverance Rover. Acesso em: 02 out. 2025.
STACK MORGAN, K. et al. The Jezero Crater, Mars: site of the Perseverance rover and the first steps of the Mars Sample Return mission. Space Science Reviews, v. 216, n. 6, p. 119, 2020. Acesso em: 02 out. 2025
HUROWITZ, J. A. et al. Redox-driven mineral and organic associations in Jezero Crater (título abreviado). Nature, 2025. Acesso em: 02 out. 2025.





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