
Mesmo depois de mais de 30 anos do fim oficial das hostilidades em 1988, as consequências desse conflito ainda impactam a região, notadas em rivalidades veladas e grupos armados.
Tendo inicio em 1980 e se estendendo até 1988, o conflito Irã-Iraque foi um dos mais longos e destrutivos do século XX. Desencadeado por disputas sobre territórios, questões religiosas e objetivos políticos, a guerra não só deixou marcas profundas nas sociedades dos dois países, como também criou um ambiente de persistente instabilidade. Ainda que os embates diretos tenham terminado há mais de três décadas, a disputa por liderança regional e domínio geopolítico continua, sobretudo via milícias e guerras indiretas.
A disputa começou em setembro de 1980, quando o Iraque, liderado por Saddam Hussein, invadiu o Irã. A alegação principal era a posse do canal de Shatt al-Arab, importante para a exportação de petróleo. Havia também uma forte preocupação política, o governo iraquiano, majoritariamente sunita, temia que a Revolução Islâmica de 1979 no Irã estimulasse a rebelião da população xiita iraquiana. A guerra tornou-se um impasse militar, com trincheiras, uso de armas químicas e grandes perdas humanas e materiais.
Após o cessar-fogo de 1988, intermediado pelas Nações Unidas, as nações retornaram às fronteiras pré-guerra, sem que nenhum lado saísse vitorioso. No entanto, o legado da guerra permaneceu. O Irã, fortalecido ideologicamente, começou a expandir sua influência na região, especialmente após a queda de Saddam Hussein em 2003. O vazio de poder no Iraque permitiu o surgimento de milícias xiitas apoiadas por Teerã, como o Kata’b Hezbollah e o Asa’ib Ahl al-Haq, que se tornaram extensões da política externa iraniana.
A partir de 2014, com a ascensão do Estado Islâmico, a presença iraniana no Iraque aumentou. O Irã ofereceu apoio militar e logístico ao governo iraquiano, reforçando sua posição no país vizinho. No entanto, essa atuação foi além do combate ao terrorismo: várias milícias pró-Irã começaram a atacar alvos dos Estados Unidos e de Israel em solo iraquiano, transformando o país em um campo de batalha indireto entre potências rivais.
Entre 2023 e 2025, os confrontos se intensificaram muito. Grupos armados iraquianos, ligados ao Irã, aumentaram seus ataques a bases militares dos EUA e a Israel, usando principalmente drones e foguetes. Os Estados Unidos responderam com ofensivas militares contra esses grupos em solo iraquiano. Em junho de 2025, o conflito atingiu seu ponto crítico, com ataques iranianos a Israel através do território iraquiano, retaliados por bombardeios israelenses dentro do próprio Iraque.
Esses acontecimentos demonstram que, mesmo sem um confronto bélico direto entre Irã e Iraque nos dias de hoje, a busca por ascendência molda a conjuntura política e a segurança da área. O governo central iraquiano, fragilizado, tem dificuldades em conter as milícias armadas que agem com auxílio de fora, promovendo a instabilidade e pondo em risco a autonomia da nação.
A Guerra Irã-Iraque se mantém, não como uma disputa territorial, mas como uma luta por influência e hegemonia regional. O Irã consolidou sua atuação no Iraque por meio de vínculos políticos, religiosos e militares, fazendo do país vizinho um elemento-chave de sua estratégia. A guerra atual é travada de forma indireta, com ataques pontuais, milícias e guerras por terceiros que envolvem potências externas como EUA e Israel. Desse modo, o conflito de 1980 ainda afeta as dinâmicas do Oriente Médio, evidenciando que algumas guerras, ainda que formalmente encerradas, seguem ativas na realidade.