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Uai é uai sô!

jun 15

4 min de leitura

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No interior de Minas Gerais, em Barão de Cocais, cidadezinha charmosa e acolhedora, conhecida por sua grande atividade mineira e seu gentil povo, cada vez mais ingleses chegavam trazendo empresas mineradoras, de forma que, seu domínio na região já era conhecido por toda a gente.

José Maria, para os mais próximos Zé, trabalhava na mineradora local na parte bruta da mineração, desde que se entendia por gente, assim como seu pai e avô o fizeram quando jovens, já que esse trabalho, era uma herança de família passada de geração em geração, de pai para filho.

Porém, com a chegada dos britânicos, seu patrão, Carlos Guimarães, estava decidido a fazer uma parceria com um inglês, senhor Smith era como era conhecido, dono de uma mineradora, que ganhava grande popularidade em sua cidadezinha no ramo mineiro, a fim de ascender ainda mais na área de extração de minérios. Assim, pôs-se a abrir muitas exceções e acatou muitos dos pedidos feitos pelo estrangeiro, um destes sendo, emprestar parte dos trabalhadores da empresa local, para a empresa do forasteiro.

Um dos trabalhadores elegidos para tal empréstimo, foi Zé, que sem escolha, se viu começando a trabalhar em um local totalmente diferente do que estava acostumado. Ali, além dos colegas que já conhecia, havia pessoas de diversos lugares, desde outros estados até do exterior, como italianos ou ingleses.

Estava acostumando-se aos poucos ao novo ambiente, mas quando estava para completar um mês de trabalho, foi chamado a sala do patrão inglês para uma conversa casual. Chegando lá, não pode deixar de perceber a falta de luminosidade do lugar, que apesar de parecer um tanto sombrio, possuía um ar levemente aconchegante e elegante devido a lareira, as luminárias, a estante repleta de livros e documentos, além da grande organização em que o cômodo se encontrava.

Assim que pôs os olhos no seu atual chefe, percebeu o gesto para sentar-se na cadeira à frente dele, e de tal forma, o fez, esperando o que o senhor Smith teria a lhe dizer.

  • -Well, José Maria right?

  • -Senhor, perdão, mais eu não falo ingrês.

  • -So, you´re going to be transferred of sector here in the company. Next week, instead of mine diamonds, you´ll start teaching the new employees how to do their work.

  • -Patrão, eu realmente não tô entendendo o que ocê tá me falando.

  • -Perdão, Zé eu me distraí e falei na minha língua nativa para o senhor, mas de qualquer maneira, o que eu queria dizer é que eu vou te mudar de setor aqui na empresa.

  • -Como assim?

  • -A partir de semana que vem, em vez de fazer a extração de diamantes propriamente dita, você irá ensinar os novos funcionários que estão chegando a exercer o mesmo trabalho que você exerceu esse tempo todo, será um estilo de treinador.

  • -Aaaaaa, então era isso?

  • -Sim. E antes de você ir, só queria te avisar algo, alguns dos funcionários novos vieram da Inglaterra em busca de trabalho e o português deles é bem básico.

  • -Sem probrema senhor, brigado pela oportunidade.

No momento em que a conversa se encerrou, Zé Maria dirigiu-se para fora da sala a fim de prosseguir com seu trabalho, mesmo nervoso com a nova tarefa que o foi apresentada. Assim, prosseguiu seu dia, assim como sua semana, aproveitando o tempo que lhe restava para exercer o que fez a vida inteira junto com seus colegas.

Na semana seguinte, começou a desempenhar sua nova função com maestria, mas se sentia incomodado, pois muitas vezes, os ingleses que seu patrão havia comentado sobre, falavam em inglês entre si. Também, diversas vezes, quando os estrangeiros não sabiam como perguntar algo, usavam sua língua nativa, perguntando com ‘why’ pra lá e pra cá, porém seu Zé não era conhecedor da língua inglesa e ,assim como os britânicos que ele treinava não sabiam fazer algumas perguntas na língua portuguesa, ele não entendia o que era esse tal de

‘uai’.

Entretanto, José sempre percebeu que o tom dessa palavra variava, desde indignação, até um tom de dúvida e curiosidade. Por consequência, como passou a conviver diariamente com essa gente, pegou a mania de usar ‘uai’ em seu dia a dia com qualquer pessoa que conhecia, mesmo sem saber o significado ou a escrita original.

Com essa nova mania, em uma conversa que teve com seu amigo de longa data, Inácio Andrade, o mesmo o questionou sobre o que seria esse vocábulo que estava sendo tão usado por seu Zé, mas o mesmo não soube responder, até o momento que reencontrou seu amigo em outra data.

  • -Inácio, velho amigo, acho que finarmente tenho a resposta pra sua pregunta!

  • -De que pergunta ocê tá falando Zé ?

  • -A pregunta do uai, uai!

  • -Lá vem ocê com esse seu trem dos ingreis de novo.

  • -Enfim, ocê queria saber o que é esse uai né ? Pois então, os ingreis, lá da mineradora, os que eu tô treinando sabe? Eles tem esse trem de sempre que vão me pregunta algo, ou quando tão indignado ou nervoso, falar esse tal de ‘uai’ primeiro.

  • -Resumi isso logo homi!

  • -Tá bom, tá bom! Uai, nesse caso , é uai sô! Uai é tudo e nada, é um sentimento, é algo que a gente pode usar em qualquer situação, basta ocê sentir que é a hora pra usar e pode falar.

Desse diálogo em diante, Inácio, inconscientemente, depois de entender o que seria essa palavra que seu amigo tanto falava, também começou a utilizá-la. Entretanto, seus conhecidos também começaram a pergunta-lo o que era o tal vocábulo, e assim, ele os explicou, de maneira, que eles também passaram a usa-la e passaram essa nova gíria, originada de uma palavra interrogativa da língua inglesa e transformada em uma palavra “ faz tudo”, a diante. Assim, a cidade inteira logo fazia uso da palavra, e em seguida o estado mineiro.

Com a popularização do ‘uai’, ele começou a ser passado de geração em geração, de forma que todos já se habituaram a escutar essa palavra, de uma maneira que nem percebem que o dizem. E até os dias de hoje, se você for em qualquer cidade de Minas Gerais, você poderá observar alguém dizendo ‘uai’ em situações das mais diversas, conscientes ou não, pois o ‘uai’ é o ‘uai’, Minas Gerais não é minas sem o uai mineiro.


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