A escravidão constitui, de forma inequívoca, um dos capítulos mais sombrios e vergonhosos da trajetória humana. A transformação de pessoas em propriedade e a consequente anulação de sua liberdade, cultura e dignidade representaram práticas de brutalidade extrema, cujos efeitos reverberam até hoje em distintas sociedades ao redor do mundo.
No caso brasileiro, destaca-se o fato de o país ter sido o último das Américas a extinguir oficialmente a escravidão, com a promulgação da Lei Áurea em 1888. No entanto, a abolição não foi acompanhada por políticas públicas que garantissem a integração dos libertos à sociedade. Sem acesso a terras, à educação ou a empregos dignos, os ex-escravizados e seus descendentes foram empurrados para a marginalização social, realidade que se reflete nas profundas desigualdades econômicas, raciais e territoriais ainda presentes no Brasil contemporâneo. Assim, a abolição acabou por se configurar, em grande parte, como um gesto simbólico, incapaz de promover mudanças estruturais efetivas.
Importa salientar que a escravidão não pertence apenas ao passado. Suas lógicas de exploração persistem, atualizadas em práticas contemporâneas como o trabalho análogo ao escravo, a exploração do trabalho infantil e as condições degradantes impostas a trabalhadores em diversos setores. Esse cenário demonstra que o combate a essas violações extrapola a esfera da memória histórica, constituindo uma exigência urgente da realidade atual.
Ademais, o racismo estrutural, herança direta do regime escravocrata, continua a reproduzir a marginalização de negros e indígenas, perpetuando desigualdades históricas. Enfrentar esse legado exige mais do que reconhecer as injustiças: impõe a desconstrução de privilégios, a adoção de políticas afirmativas e a promoção ativa da diversidade étnico-racial como pilares de uma sociedade genuinamente justa e igualitária.
Assim, refletir sobre a escravidão não se limita a um exercício de memória; é um ato de reconhecimento das bases históricas que configuram as desigualdades do presente. Trata-se, em última instância, de um compromisso ético e político com a reparação das injustiças históricas e com a construção de uma sociedade em que a liberdade e a dignidade humana sejam direitos efetivos de todos, e não privilégios de poucos.
